domingo, 19 de abril de 2009

CRÔNICA - O primeiro jogo de futebol no Brasil



Prezados leitores de O tempo e o placar...,

hoje e amanhã este espaço dará destaque a parceiros deste blogue, tanto em homenagens quanto em novas experimentações para o que vai ao ar aqui. Como todos que acompanham este espaço, ele fala sobre futebol brasileiro, comentando situações e jogos dos campeonatos jogados em todo o país.

Mas, desta vez, abre-se espaço para a literatura futebolística, num dia muito especial. 19 de abril é definido no calendário brasileiro como o "Dia do Índio". Oportunamente, vamos mostrar aqui uma versão literária sobre como foi a primeira partida de futebol em terras brasileiras.

Depois de Pero Vaz de Caminha relatar em 1500 como foi o descobrimento do Brasil, o amigo lusitano Armindo Guimarães vem aqui nos relatar como foi a realização da primeira partida de futebol em gramados brasileiros. Armindo é o português mais brasileiro que existe, e tem dentre suas características uma ampla e irreverente inspiração.

O conheci via Internet, através de outro assunto no qual temos muita afinidade: a admiração pelo cantor Roberto Carlos. Que, por sinal, comemora neste dia 19 de abril, 68 anos de idade.

Em um dos primeiros posts de O tempo e o placar..., Armindo escreveu o texto abaixo nos comentários. Este que vos escreve achou interessante guardá-lo para colocar no ar no Dia do Índio, à apreciação de todos.

Bem vindo e muito obrigado ao amigo Armindo, autor de um "golo" literário. Aos que quiserem conhecer mais de seus textos literários, basta acessar o blogue Splish splash, cujo link está entre nossos favoritos.

Abraços a todos,

Vinícius Faustini

*****

Versando a temática do desporto-rei, acredito que com a competência jornalística que é teu apanágio O tempo e o placar... irá seguramente oferecer aos seus leitores momentos de reflexão e quiçá de emoção.

Ao inaugurar tão brilhante iniciativa não podia deixar de te apresentar as minhas felicitações entrando na jogada com um golaço à Pelé (ou à Eusébio), relembrando aqui a pré-história do futebol brasileiro, quando no domingo 26 de Abril de 1500 é realizado o primeiro encontro de futebol em Terras de Vera Cruz, mais exactamente em Porto Seguro, e que doravante catapultou o Brasil como a maior e melhor “fábrica” de especialistas na matéria.

Eis a constituição das equipas e o relato do jogo:

Os Tupi

1 – Airy (Palmeira)
2 – Moema (Doce)
3 – Cauã (Gavião) – Capitão da equipa
4 – Guaraci (Sol de verão)
5 – Potira (Flor)
6 – Jaciara (Luar)
7 – Jaci (Lua)
8 – Araquém (Pássaro)
9 – Piatã (Forte)
10 – Tinga (Branco)
11 – Anauá (Pau de flor)


Equipamento: todos nus


Os Capitães da armada

1 – Gaspar de Lemos
2 – Pêro de Ataíde
3 – Diogo Dias
4 – Bartolomeu Dias – Capitão da equipa
5 – Nicolau Coelho
6 – Luís Pires
7 – Pedro Alvares Cabral
8 – Nuno Leitão da Cunha
9 – Aires Gomes da Silva
10 – Sancho Tovar
11 – Simão de Pina


Equipamento: todos vestidos


Árbitro:

Armindo Guimarães

Equipamento: Calção branco às bolinhas azuis e camisa branca com a foto do LP de 1977, do Roberto Carlos.

Juízes de linha:
Açuã (Talo de espiga)
Cajuru (Boca do mato)

Equipamentos: todos nus


RELATO DO JOGO


Colocada a bola ao centro, o árbitro, munido de um chocalho tupi, dá inicio ao jogo e as claques gritam apoiando as equipas. A equipa tupi entrou bem. Mais ousada que a equipa da frota, que apostava numa pressão alta para impedir que o meio-campo tupi pensasse o jogo. Mesmo assim, não tardou que o conjunto nativo criasse perigo. Na sequência de um canto, Anauã fez golo que o árbitro anulou por fora de jogo. A claque tupi reagiu de imediato com uma ladainha que ninguém entendeu, mas que por certo queria significar: “Fora o árbitro! Fora o árbitro! Gatuno! Gatuno! Gatuno!”.

O árbitro, que era luso com alma veracruciana, não entendendo os apupos, mas percebendo os gestos, vai daí e demite-se da sua função, entregando o apito, melhor dizendo, o chocalho, ao Frei Henrique, que passou a dirigir o jogo.

Esse lapso de tempo foi o suficiente para a equipa da frota se recompor, passando a equipa tupi a sentir sérias dificuldades em entrar na área do adversário, onde o central Pedro Álvares Cabral se mostrava imperial. Porém, quando menos se esperava, Jaciara deu nas vistas. Primeiro, fez uma arrancada que só não deu frutos porque o remate saiu torto. Depois, na marcação de um livre directo, atirou forte em direcção à baliza do goleiro Gaspar de Lemos que num golpe de rins desviou a bola para fora.

Entretanto, a passe de Moema, Potira lança a bola em profundidade para Piatã que dominando o esférico com o peito desfere um potente remate sem hipóteses de defesa para o goleiro Gaspar de Lemos. Estava feito o 1-0 que a claque tupi festeja euforicamente com gritos de contentamento e uma salva de flechadas atiradas para o ar, facto que obrigou à debandada das duas equipas que se protegiam com as mãos na cabeça. Este incidente obrigou Frei Henrique a interromper o jogo durante cerca de 15 minutos a fim de que fosse mantida a ordem e recolhidas as setas caídas no terreno de jogo.

Retomado o jogo, a bola é novamente colocada ao centro, e Bartolomeu Dias dribla um tupi, outro e mais outro, centra para Cabral que por sua vez passa para o Simão de Pina que de calcanhar enfia a bola por baixo das pernas do goleiro da equipa tupi. Era o empate e agora foi a vez da claque da armada festejar entusiasticamente a alegria do golo. A um sinal de alguém da assistência, uma das 12 naus ancoradas ao largo, arremessa para o mar uma bombarda que ecoou pela praia, ferindo os tímpanos dos jogadores e das claques.

A jogada seguinte, iniciada por Guaraci, seria, talvez, a melhor jogada do encontro, não fosse ter resultado na saída em padiola de um seu colega de equipa, o Araquém, que, centrando brilhantemente para Jaci, este devolve com um pontapé potente para o mesmo Araquém que não pôde evitar receber a bola nas vergonhas, caindo inerte na areia, sendo imediatamente levado para fora do terreno de jogo e socorrido por um dentista que logo tratou de o massajar nas partes lesionadas. Com grande resultado, diga-se de passagem, pois Araquém veio a si numa fracção de segundos.

Dado o adiantado da hora, o árbitro deu por terminado o encontro que se saldou num empate a um golo e num gesto significativo que tanto sensibilizou a equipa tupi e a sua claque, o Viajante Virtual dono da bola, ofereceu-a ao capitão tupi que, emocionado, retribuiu com um par de maracas.

Aquela bola de futebol irá ficar para sempre na Terra de Vera Cruz, e algo nos diz que os tupis farão bom uso dela.

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Amanhã é a vez do amigo Marcos Fontelles, comentarista constante de O tempo e o placar..., mostrar da visão de torcedor como assistiu ao Flamengo e Botafogo que acontecerá logo mais, no Maracanã, na final da Taça Rio.

Um comentário:

Marcos Fontelles de Lima disse...

Excelente!! Mas tenho certeza que o primeiro juiz apitara melhor que o seu substituto imediato: O Frei!!

Armindo, tua imaginação é inigualável!!