sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O espírito do futebol



"Quem ganha e perde as partidas é a alma". A frase de Nelson Rodrigues se eterniza a cada derrota definitiva, que tira de um time de futebol a possibilidade de conquistar um campeonato. Com ela, vêm símbolos da decepção e da amargura, que não aparecem com tanta força dentro de campo (afinal, a cada temporada jogadores têm presença mais fugaz num clube). A fidelidade fica na arquibancada, e parece que chega com mais força nos momentos de tristeza das equipes.

A tristeza mais recente foi a de ontem, com a eliminação do Palmeiras da Copa Sul-Americana. A imagem da capa da edição paulista do Lance! trazendo o garoto chorando, incrédulo com a derrota por 2 a 1 para o Goiás no Pacaembu, mostrou o verdadeiro retrato da frustração palmeirense. Como lembrou a Folha de S. Paulo na edição de hoje de seu caderno de esportes, a equipe do Palestra Itália encerrou de maneira melancólica uma década marcada por um rebaixamento e poucos títulos (o Campeonato Brasileiro da Série B de 2003 e o Campeonato Paulista de 2008).

Chegar à final da competição internacional era a última oportunidade do time deixar uma boa lembrança dos anos 2000. Traria a certeza de que a tradição palmeirense superaria até mesmo o elenco limitadíssimo entregue às mãos de Luiz Felipe Scolari. Só que o futebol pune o deslumbre causado por um favoritismo exagerado, até mesmo contra equipes consideradas inferiores, como foi o caso do Goiás.

Quando o favoritismo cai por terra depois de 90 minutos, a derrota fica ainda mais dolorosa. Afinal, o orgulho fomentado pela crítica esportiva é ferido de maneira brutal, pois, num esporte no qual a derrota faz parte do jogo, o torcedor ainda mantém a crença de que seu clube de coração é imbatível.



Foi o caso da Seleção Brasileira de 1982. O Brasil chegou à Copa do Mundo com uma equipe que representaria o "futebol-arte", digna de trazer o título depois de 12 anos sem conquistas. Mas o time de Júnior, Falcão, Zico e Sócrates acabou eliminado por uma Itália que priorizava o pragmatismo e a força para ser vitoriosa (e assim foi campeã na Espanha).

Acima da dimensão de crítica e público, que tornou o Brasil de 1982 um dos últimos times que mantinham a arte em seu futebol, uma imagem da arquibancada representou a decepção brasileira. Na capa do Jornal da Tarde de 6 de julho de 1982, um menino chorando com a camisa da Seleção Brasileira simbolizou a repercussão do fim de um sonho de título na Copa do Mundo que parecia tão certo.

Acima da paixão dos torcedores, que, como o nome indica, "torce" a realidade futebolística de acordo com a certeza de supremacia do clube de coração, o futebol sobrevive graças à alma das arquibancadas. Almas que explodem de alegria nas vitórias ou desabam prantos nas derrotas, sem qualquer pudor. Porque, mesmo que o espírito esportivo queira acalmar os ânimos com frases como "é só um jogo", o espírito do futebol se mantém irriquieto, e está presente desde os primeiros anos de vida como torcedor.

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Devido à onda de violência no Rio de Janeiro, O tempo e o placar... hoje não pôde apresentar o DEBATEBOLA QUATRO LINHAS. Este blogue espera que tudo se estabilize a tempo de apresentarmos uma edição na próxima segunda-feira.

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