quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O dois a um do Pacaembu



Análise de quarta - Palmeiras 1 x 2 Goiás (21h50, Pacaembu)

O placar de 2 a 1 para a equipe visitante parece ser a tônica das grandes surpresas que cercam os estádios brasileiros. Por 2 a 1 foi a vitória do Uruguai sobre o Brasil no Maracanã, na decisão da Copa do Mundo de 1950. Também em 2 a 1 terminou a vitória do argentino Estudiantes sobre o Cruzeiro, no Mineirão, pela final da Taça Libertadores da América de 2009. E em 2010, o Pacaembu foi palco de um jogo com contornos bem próximos a estas duas partidas. Um estádio repleto de torcedores do time da casa, eufóricos com a vantagem de um resultado (no caso, bastava um empate) sobre um adversário que vinha desacreditado. Mas, depois de 90 minutos, o Goiás - time que começou a semana rebaixado para a Segunda Divisão de 2011 com uma rodada de antecedência - conquistou uma inacreditável vaga para a final da Copa Sul-Americana. Com uma vitória por 2 a 1 sobre o anfitrião Palmeiras.

Os mais de 34 mil palmeirense que foram ao Pacaembu na noite de quarta-feira levaram para a arquibancada a confiança de que a batalha mais difícil havia ficado para trás. Com o gol de Marcos Assunção que sacramentou a vitória por 1 a 0 no Serra Dourada na semana anterior, o time goiano não teria força nem técnica suficientes para superar um Palmeiras que durante a semana anunciou concentração máxima na conquista da Copa Sul-Americana (ao ponto de escalar os reservas nas últimas rodadas do Campeonato Brasileiro).

O panorama do primeiro tempo não diferiu muito da expectativa da torcida. O Palmeiras apresentou mais volume de jogo, cercando a área do Goiás com jogadas criadas por Tinga e Lincoln. Vieram algumas oportunidades, com Danilo e num chute de Tinga que foi desviado com os dedos por Harlei e parou na trave. Nem mesmo a ausência de oportunidades vindas dos pés de Luan e Kléber parecia suficiente para que a bola entrasse na rede.

A postura do Goiás contribuía para o domínio palmeirense. Além de um trio de zaga, a equipe apresentava muitos jogadores de qualidade duvidosa, como os laterais Douglas e Wellington Saci e o meia Marcelo Costa. No entanto, depois da pressão inicial, o Esmeraldino aos poucos foi conseguindo ameaçar o gol de Deola com sua dupla Otacílio Neto e Rafael Moura. O último acertou um belo chute que bateu no travessão do Palmeiras.

Se a bola de Rafael Moura teve como destino o travessão, aos 33 minutos o alviverde paulista teve mais pontaria. Após receber um lançamento de Edinho, Luan avançou até a área, desviou-se de um zagueiro e chutou. A bola ainda resvalou nos dedos de Harlei antes de parar no fundo da rede. Palmeiras 1 a 0.

Os palmeirenses seguiam à risca o verso do hino do clube que aparecia num mosaico - "Torcida que canta e vibra" - e faziam festa no Pacaembu. Dentro de campo, o time de Luiz Felipe Scolari demonstrava serenidade para manter a vantagem. Mas, nos acréscimos, o Goiás reencontrou-se com a possibilidade de chegar à final da Copa Sul-Americana. Primeiro, com uma cobrança de falta de Marcelo Costa que parou no travessão. A zaga rechaçou, mas Rafael Moura recuperou a bola e fez um cruzamento. A jogada terminou numa cabeçada de Carlos Alberto que desviou em Tinga antes de entrar no fundo da rede de Deola. Aos 47 minutos, Palmeiras e Goiás iam para o intervalo com o empate em 1 a 1.

Na volta para o segundo tempo, o Palmeiras sentiu. Não a alteração do treinador do Goiás, Artur Neto, que tirou o lateral-direita Douglas para colocar em campo o atacante Felipe. Mas lidou com o empate do Esmeraldino no último momento da primeira etapa como se fosse algo inesperado, inimaginável. E a sensação de que seu favoritismo estava ainda mais ameaçado (se sofresse um gol, estaria desclassificado da Copa Sul-Americana pelo critério "gol marcado fora de casa") atou os pés dos jogadores palmeirenses.

Os chutes a gol ficaram cada vez mais escassos, e quando vieram, como nos dois chutes de Kléber, saíram sem qualquer direção. Enquanto isto, os goianos se apresentavam com mais frequência, graças aos contra-ataques originados por erros palmeirenses. Por duas vezes, Otacílio Neto chutou ao gol, e obrigou Deola a fazer grande defesa.

Luiz Felipe Scolari tentou dar mais poder ofensivo à equipe, trocando o meia Lincoln pelo atacante Dinei. Mas a substituição revelou-se equivocada. Sem Lincoln, o Palmeiras perdia um pouco do seu poder de armar jogadas, e Dinei apenas se juntava a Luan e Kléber na esperança de chegarem novas oportunidades de gol.

O Palmeiras errava. E um erro foi crucial aos 38 minutos. Márcio Araújo se atrapalhou na defesa e permitiu que Marcão avançasse pela lateral. Da linha de fundo, o jogador cruzou para a área. Rafael Moura conseguiu cabecear para o lado onde estava Ernando. Livre de marcação, o zagueiro desviou a bola de cabeça para o fundo da rede. O "azarão" da noite colocava em xeque o favoritismo palmeirense, com o mesmo placar de 2 a 1 que passou por outros grandes estádios brasileiros.

Com a mudança no placar, os treinadores agiram de acordo com o contexto de cada equipe. Artur Neto tirou o atacante Otacílio Neto e reforçou o setor defensivo do Goiás, colocando em campo o volante Jonílson. Felipão trocou o meia Tinga pelo meia-atacante Ewerthon. Mas a serenidade em verde e branco agora estava do lado do time goiano, que se encolheu bem na defesa e deixou o Palmeiras ser derrotado por seu próprio desespero.

Desespero que culminou numa grande frustração para a torcida do alviverde paulista - e não só por ver a vaga para a final da Copa Sul-Americana escorrer pelos dedos. O Palmeiras termina de maneira melancólica um ano que começou com uma campanha pífia no Campeonato Paulista, teve uma eliminação lamentável na Copa do Brasil (diante do Atlético Goianiense, nos pênaltis, após desperdiçar quatro de uma série de cinco penalidades máximas) e passou bem longe do título do Campeonato Brasileiro. A ironia final pode acontecer no domingo: caso a equipe vença o Fluminense na Arena Barueri e o Corínthians derrote o Vasco no Pacaembu, os arquirrivais corintianos se aproximarão da conquista do Brasileirão de 2010.

Além da raça, da dedicação e da seriedade, a equipe do Goiás mostrou o desejo de reescrever sua história. Com a trajetória maculada por um rebaixamento para a Série B, o Esmeraldino agora cria forças para chegar a grandes sonhos dos clubes nacionais. O primeiro deles é conquistar a Copa Sul-Americana, que seria seu primeiro grande título internacional - seu adversário na decisão será o vitorioso do duelo entre o argentino Independiente e o equatoriano LDU (a LDU venceu o primeiro jogo, em Quito, por 3 a 2). O segundo é conseguir uma vaga na Taça Libertadores da América, que a Sul-Americana dará a seu campeão.

Mas o Goiás que enfrentou o Palmeiras em 24 de novembro de 2010 já ficou marcado na história. Graças a ele, o Pacaembu teve seu episódio de um time favorito ser derrubado com uma derrota por 2 a 1. E mais um estádio brasileiro se tornou pano de fundo da grande lição do futebol: favoritismos existem para serem derrubados.


*****

PALMEIRAS 1 x 2 GOIÁS

Estádio: Pacaembu (São Paulo / SP).

Público: 34.296 presentes / Renda: R$ 711.429,00.

Árbitro: Héber Roberto Lopes (BRA) / Auxiliares: Altemir Hausmann (BRA) e Alessandro Rocha (BRA).

Gols: Luan, aos 33 minutos, e Carlos Alberto, aos 47 minutos do primeiro tempo. Ernando, aos 38 minutos do segundo tempo.

Cartões amarelos: Douglas, Marcão e Carlos Alberto (Goiás).

PALMEIRAS - Deola, Márcio Araújo, Danilo, Maurício Ramos e Gabriel Silva; Edinho, Marcos Assunção, Tinga (Ewerthon) e Lincoln (Dinei); Luan e Kléber. Técnico: Luiz Felipe Scolari.

GOIÁS - Harlei, Rafael Tolói, Ernando e Marcão; Douglas (Felipe), Carlos Alberto, Amaral, Marcelo Costa e Wellington Saci; Otacílio Neto (Jonílson) e Rafael Moura. Técnico: Artur Neto.

Nenhum comentário: