quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Quero ser grande



O carnaval agora é cinza, mas a folia do Campeonato Estadual de 2009 certamente será lembrada em muitos outros carnavais de uma cidade do interior do estado. Beneficiado pelo imbróglio judicial que tirou seis pontos do Vasco na fase classificatória da Taça Guanabara, o Resende fez história ao vencer o Flamengo - franco favorito do Cariocão e até aquele momento o único time invicto na competição - por 3 a 1 diante de 27 mil torcedores no Maracanã.

No abre-alas da semifinal carioca, o festejado time rubro-negro capitaneado por Cuca foi deixado de lado, e todos os confetes e serpentinas se direcionaram ao modesto time de fora da capital. A súbita ascensão do Resende (que no dia primeiro de março tem chance de novamente surpreender, quando enfrentará na final da Taça Guanabara o vencedor da outra semifinal, Botafogo e Fluminense) aponta um panorama curioso que vem acontecendo no futebol carioca.

Desde 2003, quando o Estadual passou a ter o formato de nos dois turnos os finalistas serem conhecidos em confrontos diretos nas semifinais (primeiro de um grupo contra o segundo do outro), as equipes consideradas "pequenas" ganham destaque, tomando o lugar de algum dos quatro grande clubes do Rio - à exceção do ano passado, um campeonato atípico, no qual em todos os jogos os "pequenos" tiveram de jogar na casa dos "grandes". Americano, Cabofriense, Friburguense, Volta Redonda e Madureira figuraram entre os primeiros lugares dos recentes estaduais, e os dois últimos citados chegaram à final do torneio, sendo derrotadas no fim, respectivamente, por Fluminense e Botafogo.

O crescimento dos "clubes pequenos" (que também aconteceu em função da queda de qualidade dos gigantes do Rio de Janeiro) teve outras consequências no futebol carioca. Se, por um lado, os destaques nos nanicos muitas vezes ganham oportunidade de vestir uniformes mais tradicionais, do outro jogadores que não têm vez nos grandes se revelam excelentes jogadores de time pequeno.

Por não ter dinheiro suficiente para investir em jogadores mais conhecidos, o Vasco nos últimos anos foi o time que destinou seu foco de contratações nos atletas que apareciam no Campeonato Estadual. No ano passado, inclusive, o clube cedeu vários de seus jogadores ao Duque de Caxias (com a ressalva esdrúxula de que eles não poderiam atuar contra o time de São Januário). Da equipe da Baixada, subiu de produção o meia Madson, que foi novamente incorporado à equipe e lutou bastante em campo, mas não evitou a queda da equipe vascaína para a Série B do Brasileirão de 2009. Atualmente, o meia defende o Santos.

No entanto, Madson é uma exceção neste caso de jogadores que têm oportunidade de jogar em equipes de maior expressão no Rio - eles só têm bom rendimento quando defendem as cores de equipes pequenas. Um exemplo disso é o atacante Muriqui.

Em 2005, Muriqui despontou como uma promessa de gols no ataque do Vasco. Entretanto, contusões e um suposto problema de alcoolismo o afastaram do sucesso no clube. O atacante voltaria a ter destaque no Estadual do ano passado, quando seus gols chamaram atenção nas partidas do Madureira - dois deles na vitória do time sobre o próprio Vasco, por 2 a 1, em São Januário.

Após boas atuações no Estadual de Pernambuco, o atacante Valdir Papel chegou ao Vasco em abril de 2006. Sua presença não fazia grande diferença até um lance pelo qual ele será eternamente lembrado de maneira negativa pelos vascaínos. No segundo jogo da final da Copa do Brasil daquele ano, o Vasco precisava derrotar o Flamengo por três ou mais gols de diferença para ganhar o campeonato (o time da Gávea vencera o primeiro jogo por 2 a 0). Com 17 minutos de jogo, Papel deu um carrinho violento no lateral Leonardo Moura, e sua atitude infantil custou um cartão vermelho e a posterior dispensa no clube - e, para a equipe cruzmaltina, a derrota para o Flamengo por 1 a 0. Dois anos depois, o jogador teria visibilidade no Madureira.

Na contramão dos casos de Muriqui e Valdir Papel, o Estadual de 2008 mostrou o fugaz destaque do atacante Alexsandro. Atuando pelo Resende, Alexsandro marcou um dos gols do time que chegou a abrir 2 a 0 sobre o Flamengo no Maracanã - o time interiorano não resistiria à pressão e terminaria o jogo com uma derrota por 4 a 2. No intervalo, o atacante declarou que seu gol (de pênalti) era a "vingança" de um torcedor botafoguense que não gostou da provocação flamenguista na final da Taça Guanabara - os rubro-negros criaram a comemoração do "chororô", porque os jogadores alvinegros reclamaram da arbitragem naquela partida. Meses depois, Alexsandro foi contratado por seu time de coração, mas após alguns jogos, caiu no esquecimento.

Atualmente, o interior é a saída para muitos jogadores que estão prestes a pendurar as chuteiras mas ainda acham que podem render em campo. Somente neste Estadual, pode-se acompanhar as atuações do zagueiro Júnior Baiano (pelo Volta Redonda) e dos atacantes Sorato (no Tigres do Brasil) e Viola (atualmente no Resende).

A ida de um "pequeno" que vai para um "grande" não fica restrita às quatro linhas. O banco de reservas também faz parte deste rodízio carioca. Técnico responsável por levar o Volta Redonda ao vice-campeonato em 2005, Dario Lourenço foi contratado com status de grande treinador pelo Vasco. Depois de 12 rodadas no Brasileiro e vendo o time amargar a presença na zona de rebaixamento, Lourenço foi demitido do clube.

Alfredo Sampaio tentou o mesmo caminho. Após boas passagens no comando de Cabofriense e Madureira, o técnico chegou ao Vasco no ano passado para ser auxiliar de Romário (em sua primeira empreitada no banco de reservas). Com o desentendimento entre o Baixinho e o presidente Eurico Miranda, Alfredo passou a responder como treinador do clube. Mas a derrota para o Volta Redonda por 2 a 1 em São Januário, aliada a desavenças com Edmundo, causaram sua demissão.

Nesta Taça Guanabara de 2009, brilhou a estrela de mais um jogador que está num clube pequeno mas "quer ser grande". O atacante Bruno Meneghel (foto) é, até o momento, o artilheiro do Estadual, mas já entrou para a história do clube por outro motivo: ele ajudou a construir a vitória do Resende sobre o Flamengo.

Após o jogo, Meneghel acusou a antiga diretoria do Vasco de desprezar seu futebol. Segundo o atacante, Romário confiava em seu potencial e dizia que ele era bom jogador. Mas no dia seguinte à saída do ex-camisa 11, Bruno nunca mais teve oportunidade nem de ficar na reserva. Na primeira chance, deixou o clube.

Bem, apesar de ter feito muitos gols na primeira parte do campeonato, Bruno Meneghel também vem aparecendo pelo grande número de chances desperdiçadas em campo. Somente na partida do sábado de carnaval, foram dois gols perdidos.

Hoje o Rio de Janeiro conhecerá o clube credenciado a disputar com o Resende a final da Taça Guanabara. No próximo domingo, o futebol escreverá mais uma página desta saga que vem acontecendo com frequência no campeonato carioca. Mesmo tendo sido escrita através das linhas tortas do "tapetão", a trajetória atual do Resende ajuda a sobreviver a graça das histórias do futebol - que tem um vasto espaço para os "fracos" que derrubaram os mais fortes em tradição.

5 comentários:

CON disse...

Oi amigo, quero parabenizá-lo por mais este blog!
Você é mesmo "fera"em tudo que faz!!!
Eu, não entendo nada de futebol, mas gosto de me informar, muito boa a matéria.

Beijos azuisss

Marcos Fontelles de Lima disse...

Vinícius, tenho uma visão um pouco diferente...

Primeiro uma pergunta. Como é que pode o Flamengo e tantos times grandes do Brasil, estarem lotados em dívidas? Como é que pode o Flamengo ter bons patrocínios, ter estádios lotados, ter lojas com produtos para vender e torcedores apaixonados para comprar!!!
Acho que os times pequenos (de torcida e de dívidas) nem existiriam, se o futebol nã fosse rentavel, pois o Resende por exmemplo, não tem patrocínio milionário, não tem fabricante de material esportivo, não lota um maraca e nem consegue vender produtos com a marca do clube.

Como pode então um time desse ganhar o Flamengo? a resposta é simples. Há dinheiro desviado.

Outro fator importante, é que um jogador bom, para jogar no exterior de expressão, precisa jogar num time grande, e talvez até jogar na seleção brasileira (ou de brasileiros?). Como, a regra é clara, e cada time só pode jogar com 11 jogadores, é muito comum um jogador medíocre ocupar o lugar de um jogador bom devido a influencia de empresários, que querem vender o seu produto para o exterior. Com isso, este jogador bom, sem espaço no time grande, vai se aventurar em times pequenos, e se juntam a alguns jogadores em fim de carreira, montando assim uma equipe competitiva para o futebol jogado no Brasil. e aí a história toda vc já contou no seu relato...

"Há braços"

Marcos Fotelles de Lima!

Marcos Fontelles de Lima disse...

Ah!! aí seria: um time grande com jogadores medianos, porém bem treinados, bem alimentados X time pequeno com jogadores bons, mal treinados e mal alimetados. Isso quando o jogador do time pequeno não necessita ter um outro emprego...

Vinícius Faustini disse...

Con, obrigado pela presença aqui no meu blogue. Eu também não entendo muito não, só faço os meus pitacos.

Marcos, essa questão que você apontou é bem delicada mesmo. Eu acredito, SIM, que haja dinheiro desviado em todos os clubes (todos, inclusive os pequenos), mas não sei se isto explicaria o "fenômeno" Resende, por exemplo.

Acho que estes times acabam tendo um "mecenas" por perto (legalizado ou não) - acredito que, no caso do Resende, a prefeitura da cidade dê algum dinheiro pra eles. Estes times acabam sendo também uma vitrine pros jogadores - o próprio Bruno Meneghel afirmou que gostaria de voltar a jogar no Vasco.

Vitrine ou não, acho válido quando aparece algum time pequeno - mesmo a consequência sendo a equipe se desfazer logo em seguida. É bom os "grandes" (em especial do Rio) terem esses sustos, pra mostrar que precisa melhorar muito para disputar um Brasileiro.

Abraços,

Vinícius Faustini

www.otempoeoplacar.blogspot.com

www.diariodeumsalafrario.blogspot.com

www.emocoesrc.blogspot.com

Marcos Fontelles de Lima disse...

Ah!! isso "com cerveja". Lá em Belém, isso é comum... Tem um time de lá por exemplo, o Ananindeua, que tem o prefeito da cidade de mesmo nome, que é o DONO do time, e filho do conhecido Jader Barbalho, que ajuda o Ananindeua de fato.

Gostei da bola desse Bruno Meneguel...

Acho excelente os times do interior se profissionalizarem, pois aumenta o nível do futebol. Faço uma comparação com a Lei da concorrencia: Quanto mais times disputando de fato, melhores vão ser a oferta para nós o público. Não é a toa que o futebol paulista está num patamar acima... graças a Sao Caetano, Bragantino, Guarani etc.

"Há braços"

Marcos Fontelles de Lima!!